Embora o CMC (Carboximetilcelulose de Sódio) seja uma das gomas mais utilizadas na indústria alimentícia ao redor do mundo, alguns dos aspectos que o destacam no “mundo das gomas” eventualmente passam despercebidos. O CMC, não raramente, é visto de um modo um tanto simplório, o que não deixa de ser normal em virtude de uma série de fatores.
Não raramente o CMC é simplesmente identificado como CMC 3000 e CMC 5000, números que se referem à viscosidade de sua solução aquosa, a saber, 3000 cP @ 1% e 5000 cP @ 1%. É como se houvesse só esses “dois tipos de CMC”. Além disso, parece que o CMC é considerado apenas como um mero “doador de viscosidade” ou espessante. Obviamente o CMC é um grande espessante, mas sua utilização não está restrita a essa funcionalidade como muitos sabem. De acordo com o JECFA (Joint FAO/WHO Expert Committee on Food Additives), o CMC, além de espessante, estabilizante e emulsificante, também é citado como como agente de volume, agente de endurecimento, agente gelificante, agente de revestimento e umectante, entre outras funções não registradas no JECFA.
A indústria alimentícia conta com uma grande oferta de gomas: agar ou agar-agar, alginatos, carragenas, CMC, goma arábica (ou acácia), goma gelana, goma guar, goma konjac, goma tara, goma xantana, LBG, pectinas. Entre elas o CMC se destaca em alguns aspectos muito importantes. Esse destaque, porém, nem sempre é percebido, o que acaba por restringir a obtenção de bons resultados, quer seja na solução de um problema técnico ou na busca de uma melhor relação entre custo e benefício. Além disso, há uma espécie de complicador em meio a tudo isso: a existência de muitos CMCs diferentes, que não raras vezes dificulta sua exploração em virtude de limitações de recursos para a realização de testes ou por falta de tempo.
Muita coisa pode ser dita a respeito do CMC, mas destaca-se aqui apenas três aspectos de grande importância que costumam diferenciar o CMC de outras gomas e que normalmente não são conhecidos, ou bem conhecidos, por um bom número de profissionais da indústria alimentícia. São eles:
1 - Viscosidade
O CMC é a única goma que pode ser produzida e fornecida num amplo espectro de viscosidade. Há CMCs de baixa, média e alta viscosidade, cada um com sua respectiva faixa de viscosidade. Se estabelecermos como referência a viscosidade da solução aquosa a 1%, há muitos CMCs distribuídos na faixa de 10 cP a 8000 cP (mais ou menos). Essas diferenças de viscosidade são tão grandes que fazem com que um CMC seja extremamente diferente de outro, como se fossem gomas de naturezas diferentes.
2 - Facilidade de modificação
Refere-se à facilidade com que o CMC pode ser modificado para produzir características diferenciadas. Diferentemente de outras gomas que são diretamente extraídas de espécies botânicas (algas, leguminosas, frutas e caules e raízes de plantas) ou de processos biológicos, o CMC é obtido mediante um processo químico bem controlado. Isso permite que ajustes possam ser feitos, quer seja na receita de obtenção ou nas condições de processo, de modo a produzir CMCs com diferentes características. Como exemplo, há os CMCs que não são resistentes em meio ácido e há os que são resistentes nesse meio. No aspecto reológico, há os CMCs que apresentam soluções aquosas meramente pseudoplásticas, como qualquer goma de modo geral, e há os que, adicionalmente, apresentam tixotropia. Isso sem falar na diversidade de viscosidade comentada no tópico acima. Essas características são muito importantes quando se considera a reologia de um sistema pastoso, como massas por exemplo, ou a manutenção de sólidos em suspensão.
3 - Associação com proteínas
Sistemas proteicos podem ser estabilizados com gomas. Isso não é novidade para muitos, apenas para não dizer que não é novidade para ninguém. O que não é de conhecimento da maioria são os mecanismos associados a essa estabilização.
A estabilização de proteínas proporcionada pelas gomas de modo geral, resulta, via de regra, do efeito de viscosidade devido à formação de “gel”. Trata-se do desenvolvimento de uma estrutura interna de rede, algo bem conhecido, principalmente pelos engenheiros de alimentos. Embora esse tipo de estabilização seja razoavelmente bem conhecido e muito utilizado, ele apresenta suas limitações. Esse tipo de estabilização pode sofrer impactos negativos quando o sistema proteico é aquecido ou diluído. Além disso, esse tipo de estabilização não é adequado para sistemas proteicos de baixa viscosidade.
O CMC, por sua vez, atua de modo diferente. Devido à sua natureza iônica (o CMC é aniônico), ele pode interagir com proteínas e com elas formar complexos que podem ser solúveis ou insolúveis. O mecanismo básico dessa interação não é a viscosidade, mas mecanismos iônicos, ainda que ligações hidrogênio, efeitos estéricos e forças de Van de Waals também tenham suas contribuições.
Como exemplo, o CMC pode interagir com a caseína do leite em pH ácido e formar complexos solúveis e estáveis ao armazenamento e ao tratamento térmico. Salvo casos especiais, sem o CMC a caseína normalmente precipitaria nessa faixa de pH. Na prática, o CMC “altera” o ponto isoelétrico da proteína para valores de pH mais baixos. Outras gomas, em virtude de suas naturezas, não proporcionam tal efeito, principalmente a proteção térmica.
Esses são apenas três pontos que consideramos os principais na diferenciação entre o CMC e outras gomas. Há muito mais sobre o CMC que deveria ser bem conhecido para que ele, sozinho ou em combinação com outras gomas, pudesse proporcionar as soluções demandadas pela indústria de alimentos.
* Antonio Luis Barboza Filho
Denver Especialidades Químicas Ltda.
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