O termo glúten deriva do latim glúten, tradução latina de “cola”. Trata-se de uma proteína amorfa, composta basicamente pela mistura de cadeias proteicas longas de gliadina e glutenina, encontradas dentro de grãos de trigo, cevada e centeio, mais precisamente no endosperma, que é a reserva nutritiva do embrião da planta.
A fração proteica do glúten apresenta propriedades únicas para a construção das estruturas que são usadas no processamento de alimentos. As propriedades únicas da farinha de trigo, por exemplo, podem ser atribuídas principalmente à sua fração de glúten.
O glúten possui propriedades de formação de rede inigualáveis, importantes para produtos fabricados com variedades de trigo duro e que, geralmente, envolvem um estágio intermediário de massa coesa durante o seu processo de produção, como por exemplo, pão, macarrão e biscoitos.
O glúten é encontrado nos cereais e possui grande valor nutricional, com alto índice de proteínas e baixo conteúdo de carboidratos. Tanto os grãos como as sementes são alimentos dos quais se obtém fibras, todas as vitaminas do complexo B, carboidratos, potássio, selênio, ferro e magnésio, sendo uma excelente fonte de proteínas.
A dieta sem glúten é o tratamento mais seguro para pacientes com doença celíaca. Sua origem remonta a 1941, quando um relatório sobre o tratamento dietético da doença celíaca, de autoria do pediatra e cientista Willem Karl Dicke, se tornou público. Hoje, a dieta continua a ser aplicada e pesquisada para uma variedade de propósitos adicionais de saúde, incluindo o gerenciamento de sensibilidade não celíaca ao glúten, síndrome do intestino irritável, diabetes, dermatite herpetiforme, inflamação e obesidade.
No entanto, nos últimos anos, tem se tornado uma das mais populares dietas seguida pela população em geral e por pacientes afetados por outras condições clínicas, como sensibilidade ao glúten não celíaco, síndrome do intestino irritável, doenças neurológicas, psiquiátricas e reumatológicas e para melhorar a prática esportiva.
Remover completamente o glúten da dieta acarreta o risco de deficiências nutricionais. A adequação nutricional da dieta sem glúten e de produtos associados sempre foi uma preocupação para os consumidores, profissionais de saúde e a indústria. Embora alivie os sintomas e promova a cura gastrointestinal em pacientes com distúrbios relacionados ao glúten, a sua adesão em longo prazo pode ter limitações nutricionais simultâneas.
Os produtos sem glúten compartilham uma composição comum de ingredientes crus, incluindo milho, arroz, soja, mandioca e batata, que substituem os grãos que contêm glúten, como trigo, centeio e cevada utilizados na composição de produtos comuns. No geral, os itens sem glúten são mais ricos em gordura, açúcar e sódio, quando comparados aos produtos comuns, embora as tendências de composição possam variar de acordo com o tipo de produto. O conteúdo total de gordura de pães sem glúten, por exemplo, é aproximadamente o dobro da quantidade encontrada em suas contrapartes contendo glúten. Da mesma forma, as massas sem glúten apresentam níveis mais altos de carboidratos e sódio.
Geralmente, os produtos sem glúten também são fontes inferiores de proteínas e fibras alimentares. O índice glicêmico (IG) dos produtos sem glúten varia de acordo com o tipo e a qualidade dos ingredientes utilizados, bem como com os procedimentos de processamento de alimentos realizados para fabricá-los. Como os itens sem glúten não são tipicamente fortificados ou enriquecidos da maneira como muitos produtos comuns, geralmente, apresentam menos folato, ferro, niacina, tiamina e riboflavina.
A ingestão inadequada de ferro, ácido fólico, cálcio, selênio, magnésio, zinco, niacina, tiamina e vitamina A e D tem sido demonstrada em indivíduos que consomem dietas sem glúten. Estudos clínicos relataram alto nível de homocisteína em pacientes com doença celíaca após um período de 10 anos de dieta sem glúten, embora a mucosa tenha melhorado, demonstrando deficiência de ácido fólico, vitamina B6 e vitamina B12. Os estudos também relataram que a síndrome metabólica pode se desenvolver em períodos tão curtos quanto um ano após uma dieta sem glúten em pacientes adultos com doença celíaca.
A dieta sem glúten sempre foi cercada por controvérsias. Excluir o glúten da dieta é benéfico para as pessoas que sofrem de doença celíaca, mas, segundo a comunidade científica, para a maioria das pessoas, não traz nenhum benefício prático. Os alimentos livres de glúten são feitos com grãos refinados e, por isso, só possuem o endosperma, sendo, consequentemente, menos nutritivos.
Por outro lado, os adeptos da dieta sem glúten focam o seu benefício na eliminação de eventuais desconfortos abdominais provocados pela substância e, na verdade, algumas pesquisas comprovam que o nível de inflamação do organismo se eleva por reação ao glúten e à lactose, aumentando a predisposição à manifestação de problemas cardiovasculares e de doenças autoimunes, entre elas o diabetes tipo 1.
Nesse impasse, a ciência concorda que o glúten não é uma substância completamente inofensiva e que não pode ser consumido por portadores de doença celíaca. Nesses indivíduos, a ingestão do composto ocasiona uma reação autoimune que, com o tempo, produz danos na mucosa do intestino delgado, causa má absorção de nutrientes e pode levar a uma grande variedade de sintomas, como diarreia, distensão abdominal e perda de peso.
Outra grande controvérsia no meio científico é em relação a sensibilidade ao glúten. Um estudo da Monash University, de Melbourne, na Austrália, revelou que a sensibilidade existe, mas não é tão comum e que, na verdade, o responsável pelos sintomas desconfortáveis não é o glúten, mas um tipo específico de carboidrato conhecido como FODMAPs (conjunto de alimentos fermentáveis que são mal absorvidos pelo organismo e que podem causar desconforto intestinal). Segundo o estudo, pessoas sem doença celíaca, mas com desconforto abdominal, podem se beneficiar com a redução do consumo de alimentos com trigo, mas isso está sendo atribuído incorretamente ao glúten. Os estudos realizados não identificaram qualquer evidência de que o glúten seja o responsável por tais sintomas.
Em contrapartida ao estudo realizado pela Monash University, alguns cientistas afirmam que a intolerância alimentar, geralmente envolvendo o açúcar dos alimentos e os FODMAPs, é muito diferente da sensibilidade ao glúten, mas admitem que podem agravar o quadro clínico da sensibilidade ao glúten.
Outros pontos destacados pela comunidade científica contrária a dieta é a privação do organismo de uma boa parte de carboidratos, uma importante fonte de energia, e é que o emagrecimento resultante da dieta advém da redução do consumo de alimentos calóricos, nos quais há a presença do glúten, como os pães e as pizzas, os quais são as fontes de vulnerabilidade para que a pessoa engorde.
Essa também é uma controvérsia no meio científico: a dieta sem glúten emagrece? Ainda não se chegou a um consenso, mas o fato é que retirar o glúten do cardápio tornou-se a solução mais propagada para perder peso e ter mais saúde.
Mesmo diante das controvérsias, a comunidade científica concorda em um ponto: para garantir que aqueles que seguem a dieta sem glúten não apresente riscos adicionais à saúde, bem como evitem a deficiência de macro e micronutrientes, é importante o acompanhamento adequado, a colaboração de um nutricionista e a educação nutricional.