Diferentes produtos alimentícios possuem diferentes requisitos no que diz respeito à funcionalidade da gordura que contêm. Esses requisitos, muitas vezes, podem ser condensados em quatro atributos básicos: ponto de fusão e perfil de fusão; características de cristalização; estabilidade de armazenamento (estabilidade oxidativa e hidrolítica); e necessidades nutricionais.
As gorduras usadas em produtos de panificação, biscoitos e confeitaria, por exemplo, precisam de um certo nível de gordura sólida presente na temperatura em que a massa é misturada, a fim de produzir estrutura suficiente para manter uma estrutura leve e aerada. As massas de biscoito e pastelaria são frequentemente misturadas a cerca de 25°C. Nessa temperatura, a gordura da massa utilizada deve, idealmente, conter entre 25% e 40% de gordura sólida. Níveis mais altos de gordura sólida tornam a massa difícil de misturar; níveis mais baixos de gordura sólida correm o risco de parte da gordura líquida ser exsudada do biscoito ou confeitaria final, tornando-o oleoso ao toque.
Historicamente, as gorduras animais, como a banha e o sebo bovino, eram usadas em muitas dessas aplicações. No entanto, foram eliminadas, em parte por razões éticas e religiosas e em parte porque esses tipos de gorduras animais foram considerados prejudiciais à saúde devido aos altos níveis de gordura saturada e, portanto, altos riscos de doenças cardiovasculares. Atualmente, essas duas gorduras animais foram amplamente substituídas por óleo de palma ou por misturas de óleo de palma e suas frações ou por óleo de colza.
O pão, particularmente o pão produzido em fábrica, possui um requisito muito específico para a presença de uma pequena quantidade (normalmente cerca de 3%) de gordura com ponto de fusão muito alto. Este se cristaliza em torno das bolhas formadas durante o tempo em que a massa do pão está fermentando, crescendo e formando uma monocamada de cristal ao redor dessas bolhas. Devido ao alto ponto de fusão da gordura usada, pode reter sua estrutura durante os estágios iniciais de cozimento e, assim, manter a estrutura aerada do pão.
O chocolate e coberturas semelhantes a chocolate precisam ser sólidas em temperatura ambiente, mas derreterem rapidamente em temperatura da boca. A manteiga de cacau faz isso e é obviamente o padrão ouro no que diz respeito a esse atributo. Atualmente, os fabricantes de chocolate usam uma pequena quantidade de gordura vegetal não-cacau, denominada equivalente de manteiga de cacau. No entanto, existem várias limitações impostas para esse uso, tanto em termos da quantidade como em relação aos tipos de gordura que são usados.
A manteiga de cacau é rica em triglicerídeos monoinsaturados simétricos, ou seja, triglicerídeos com um ácido graxo saturado (principalmente ácidos palmítico e esteárico) nas posições 1 e 3 e um grupo de ácido oleico na posição 2. Como esses triglicerídeos constituem mais de 80% da composição da manteiga de cacau, lhe conferem propriedades de fusão muito nítidas. Também são polimórficos, o que significa que cristalizam em várias formas de cristal. Essas diferentes formas de cristal possuem diferentes estabilidades. Os dois com maior estabilidade estão na forma beta (β). A manteiga de cacau no chocolate deve se cristalizar na forma beta, ao invés de em qualquer uma das formas de estabilidade inferior, caso contrário, será macia, difícil de desmoldar e apresentará recristalização da gordura na superfície do chocolate. Para garantir a forma correta do cristal, o chocolate é temperado, um processo que envolve resfriar e reaquecer levemente o chocolate. As gorduras vegetais utilizadas no chocolate também precisam ter a mesma estrutura básica de triglicerídeos monoinsaturados simétricos e, como isso as torna também polimórficas, possuem a mesma necessidade de serem temperadas. As gorduras típicas usadas dessa forma são a fração de fusão intermediária do óleo de palma e a fração de estearina da manteiga de karité.
Já em coberturas de confeitaria são usados substitutos da manteiga de cacau baseados em frações de óleo de palma que possuem compatibilidade bastante limitada com a manteiga de cacau, permitindo, assim, que baixos níveis de manteiga de cacau estejam presentes.
Os substitutos da manteiga de cacau são baseados no óleo de palmiste, geralmente a fração de estearina, e não têm compatibilidade efetiva com a manteiga de cacau, o que significa que apenas o cacau em pó com baixo teor de gordura pode ser usado com eles.
Em geral, as gorduras para sorvete precisam de, no mínimo, 50% de gordura sólida a 0°C para estruturar o sorvete, mas devem ter ponto de fusão abaixo da temperatura normal da boca, porque durante o consumo do sorvete, a boca esfria. O sorvete de leite deve conter apenas gordura láctea, ou seja, normalmente gordura de leite de vaca. O sorvete não lácteo pode ser baseado em gorduras vegetais. Devido a esses requisitos de fusão, o óleo de palmiste ou óleo de coco são geralmente usados como óleo base em sorvetes não lácteos. O óleo de palma é usado ocasionalmente, mas retém alguma gordura sólida acima da temperatura da boca, o que pode alterar a textura do sorvete. O óleo de palma é, às vezes, usado em sorvetes de chicoteamento suave, pois mantém o formato e a textura do sorvete por mais tempo do que o óleo de palmiste.
Os óleos de fritura precisam ter alto grau de estabilidade oxidativa devido à alta temperatura de uso. Os ácidos graxos saturados e os ácidos graxos trans possuem grau muito maior de estabilidade oxidativa do que os ácidos graxos insaturados cis. Como esses óleos são usados a 180°C para fritar, os pontos de fusão mais elevados e os níveis de gordura sólida em gorduras mais saturadas ou ricas em trans são irrelevantes e, portanto, historicamente, os óleos de fritura têm sido baseados em banha, sebo bovino e gorduras parcialmente hidrogenadas. Pelas mesmas razões que foram removidos dos produtos de panificação, também foram eliminados dos óleos de fritura. As principais opções de óleo para fritar são a oleína de palma (estabilidade aceitável, mas contém cerca de 40% de saturados), óleo de girassol ou óleo de colza (estabilidade muito menor, mas também muito menos saturada) ou a variedade alto oleico de óleo de girassol. Como a estabilidade oxidativa está relacionada ao grau de insaturação, o óleo de girassol convencional, que é rico em ácido linoléico, é menos estável do que a variedade mais nova, rica em ácido oleico. O óleo de girassol com alto teor de oleico é, portanto, visto como uma boa opção entre alta estabilidade oxidativa e baixos níveis de saturados.
Além de todos esses requisitos de funcionalidade nas diferentes aplicações descritas, as gorduras precisam ser nutricionalmente aceitáveis.
Apesar da sua importância no processamento de produtos alimentícios e, inclusive na saúde, a gordura tem sido associada a vários tipos de doenças. Diante da modificação dos hábitos alimentares e visando a redução da ingestão de gordura, os fornecedores estão trabalhando em alternativas que atendam a ambos os requisitos e, uma delas são as gorduras vegetais, produtos constituídos principalmente de glicerídeos de ácidos graxos de espécies vegetais que podem conter pequenas quantidades de outros lipídios, como fosfolipídios, constituintes insaponificáveis e ácidos graxos livres naturalmente presentes no óleo ou na gordura.
A diversidade dos diferentes óleos e gorduras que estão presentes na natureza ou que são originados por processos industriais baseia-se nos ácidos graxos que fazem parte dos seus triglicerídeos, sendo os componentes mais importantes, tanto do ponto de vista estrutural como nutricional.
Em função do ácido graxo principal em sua composição, os óleos e gorduras vegetais são divididos em categorias. Os provenientes do ácido graxo láurico, inclui os óleos e gorduras vegetais de coco, babaçu e palma (caroço); os do ácido graxo palmítico, são os óleos e gorduras de palma (polpa); os do ácido graxo oleico estão incluídos na categoria de oliva, amendoim, canola e arroz; os do ácido graxo linoleico (médio), são os de soja, algodão, milho e gergelim; os do ácido graxo linoleico (alto), inclui os de girassol e açafrão; e os provenientes do ácido graxo erúcico, são os óleos e gorduras vegetais de colza.
O desenvolvimento de soluções para substituir as gorduras parcialmente hidrogenadas sem comprometer o sabor, textura, consistência e estrutura dos produtos, apresenta uma gordura com baixo teor de saturados e zero trans, que mantém a estrutura dos alimentos e sabor, além de utilizar matérias-primas amplamente disponíveis no mercado.
Atualmente, a indústria de alimentos dispõe de opções de gorduras vegetais que atendem as normas voltadas à saúde e que podem ser usadas para atender as características organolépticas dos alimentos, como modificar a textura e aumentar o shelf life, ou ainda, ser utilizadas na produção de margarinas e cremes vegetais.
Uma das opções que se destacam é o óleo de palma. Utilizado no desenvolvimento de blends com outros óleos que venham a atender todas as necessidades do mercado, obtendo um produto final zero trans, tem como principal característica a versatilidade, mantendo, mesmo em altas temperaturas, as suas propriedades. Apresenta textura macia, não tem odores que possam interferir no sabor dos alimentos, contém conservantes naturais, tem maior rendimento se comparado aos demais óleos, e não há a presença de organismos geneticamente modificados. Seus principais empregos estão nas frituras industriais, aspersão de extrusados, chocolates, massas, margarinas, cremes vegetais, biscoitos e sorvetes.
Outra alternativa são as gorduras vegetais produzidas a partir do óleo de soja, uma fonte de grande disponibilidade de gorduras poliinsaturadas e monoinsaturadas, além de ser isenta de colesterol. São as mais utilizadas nas aplicações industriais, conferindo textura plástica adequada para as aplicações a que se destinam, realçando o sabor e facilitando o desenvolvimento dos produtos finais. Estão presentes na produção de sorvetes, frituras, massa de biscoitos, recheios e cremes, pré-misturas de bolos, entre outras aplicações.
A característica do alimento é altamente influenciada pelo perfil da gordura. Assim, quanto maior o teor de gordura no alimento, mais essencial é a escolha da gordura adequada. Para isso, é importante considerar aspectos como desempenho/funcionalidade, perfil nutricional, características da gordura e características desejadas na aplicação.
Atualmente, a indústria dispõe de mais de 200 ingredientes que podem ser usados para substituição da gordura em alimentos.